Pescadores da Amazônia clamam por ajuda em meio à seca extrema

BBC News Brasil
A escassez de água coloca em risco a subsistência de comunidades ribeirinhas na região
A seca devastadora que atinge a Amazônia neste ano tem provocado sérias consequências para comunidades ribeirinhas, que veem sua única fonte de sustento, a pesca, ameaçada. Entre as vozes que clamam por socorro está a de Izabel Serrão, que relata a difícil realidade enfrentada por sua comunidade.
Izabel Serrão, uma pescadora que dedicou sua vida às águas dos rios Jaú e Negro, descreve um cenário alarmante. O rio Negro, na região de Manaus, está a menos de dois metros de alcançar seu nível mais baixo da história, resultado de uma seca severa que já afeta diretamente mais de 500 mil pessoas na região.
“É o nosso costume ver o rio subir e descer durante o ano, mas neste ano a seca chegou muito rápido e pegou todos de surpresa”, lamenta Izabel. Com um barco encalhado e sem saída para o mar, a pescadora se vê presa em terra, cercada por areia e com uma lagoa sem saída a dois quilômetros de sua casa.
Dados da Defesa Civil do Amazonas revelam que a situação é crítica: em 26 de setembro, o rio mediu apenas 13,92 metros, apenas 1,22 metro acima da mínima registrada em 121 anos de medições. A taxa de redução diária chegou a 20 cm, o que se mantiver poderá bater recordes históricos ainda neste ano.
Rogério Marinho, especialista em Clima e Ambiente da Universidade Federal do Amazonas, explica que, embora haja um sinal de esperança com o aumento dos níveis em algumas partes do rio, “a realidade é alarmante” e a expectativa é que a seca permaneça entre as maiores em 120 anos de monitoramento.
As condições são ainda mais desesperadoras para as 90 famílias que habitam flutuantes no Cacau Pirêra, onde 90% da população depende da pesca. “Em tempos normais, posso sair de casa e pegar peixe em questão de minutos. Mas desde 2023, nada”, relata Izabel.
O geógrafo Rogério Marinho também denuncia que o fenômeno El Niño, associado ao aquecimento das águas oceânicas, contribui para a intensificação da seca, que vem se tornando uma realidade cada vez mais frequente. “Esses episódios que antes ocorriam a cada 20 ou 30 anos estão agora ocorrendo em menos de 10 anos e com maior intensidade”, alerta.
A precariedade da situação levou o ministro de Desenvolvimento Social a cogitar criar um auxílio emergencial para os pescadores afetados. Entretanto, as informações sobre a implementação desse apoio ainda são incertas, e muitos moradores do Cacau Pirêra continuam sem assistência.
Enquanto isso, a devastação ambiental também se faz sentir: o Amazonas registra o maior número de queimadas desde 1998, com um aumento de 66% em relação ao ano anterior. A qualidade do ar em Manaus foi considerada a pior entre as capitais brasileiras, e muito se deve a essas queimadas que ocorrem sem controle.
No cotidiano da pescadora Izabel e do seu vizinho Ronilson, a mescla de esperança e desespero é palpável. “Pescar é o que sei fazer. Preciso desse rio para continuar nosso trabalho e alimentar as pessoas”, afirma Izabel. Ronilson complementa: “Se você ama seu lar, você nunca o deixaria para trás.”
A luta pela sobrevivência das comunidades ribeirinhas é um reflexo da crise ambiental que vivemos atualmente. A seca e suas consequências não são apenas uma questão local, mas um chamado urgente para a ação coletiva em defesa da natureza e dos povos que dela dependem. É fundamental que a sociedade se una para exigir políticas públicas eficazes que garantam a proteção ambiental e a assistência às populações afetadas.